Ideb não é parâmetro para discutir a
qualidade da educação
Por Carlos Eduardo Sanches. Publicado em Uol Notícias (10/09/2014)
Divulgados os resultados. E aí, melhorou ou piorou a qualidade da
educação? Onde o indicador cresceu todos os problemas estão resolvidos? E nas
escolas, municípios e Estados que registraram queda nada foi feito durante dois
anos? Não temos a resposta pra estas e tantas outras perguntas porque o Ideb
(Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) não tem essa capacidade.
Discutir qualidade da educação a partir do Ideb seria o mesmo que buscar
uma definição da educação dentro de uma fábrica: estipular as tarefas,
determinar a programação de ações, focar na execução dos serviços, providenciar
a medição dos resultados e, claro, dar atenção especial à aferição do lucro.
Acontece que professores não são robôs e os estudantes, tampouco, máquinas.
Ao contrário do que alguns possam imaginar, a educação é um direito, e
não um serviço ou produto. Cada estudante tem um tempo e um modo de aprender e
não há como definir que sua trajetória escolar siga padrões e regras
pré-estabelecidos. O ambiente da sala de aula é diferente do chão de uma
fábrica: enquanto operários manipulam máquinas os professores estimulam o
desenvolvimento cognitivo de seres humanos.
Se Garrincha estivesse vivo poderia analisar o resultado do Ideb 2013
com sua maravilhosa frase: "esqueceram de combinar com os russos".
Infelizmente, o Ideb surgiu na educação brasileira ao mesmo tempo em que em
diversas regiões do mundo abandonavam a política do "accountability",
com vistas à responsabilização de professores e gestores.
A realidade fica mascarada quando um indicador
sintético combina informações sobre a aprendizagem de poucos alunos.
Carlos Eduardo Sanches: conselheiro estadual de educação no Paraná,
sobre problemas na avaliação educacional do país.
Um dos exemplos é a fracassada reforma educacional de Nova York, segundo
seus próprios criadores. Avaliação é fundamental no processo educativo, mas
provoca desastrosos resultados quando utilizada apenas de maneira gerencial com
foco no estabelecimento de rankings, comparações, na definição de programas de
governo ou na destinação de abonos salariais.
É preciso reconhecer que o Brasil avançou nos últimos anos na discussão
sobre avaliação na educação. Pena que escolhemos o caminho errado. A realidade fica
mascarada quando um indicador sintético combina informações sobre a
aprendizagem de poucos alunos, em apenas algumas áreas, frente às taxas de
aprovação.
As escolas brasileiras matriculam somente estudantes de 5º e 9º anos do
ensino fundamental e 3º do ensino médio? Os alunos frequentam a escola apenas a
cada dois anos? Todas as turmas têm mais de 20 alunos? A realidade local, o
contexto sociocultural e as ciências da vida não fazem parte da formação do
cidadão? Onde estão nesse indicador a formação inicial e continuada dos
professores? E a infraestrutura das unidades escolares? Todos os estudantes têm
o mesmo nível socioeconômico?
Esta lógica é decepcionante porque está centrada na comparação entre os
desiguais. Na educação, dois processos estão presentes: um é o do ensino, e
outro, da aprendizagem. É possível ter mesmo nível de domínio sobre ambas as
variáveis? Isso dá pra ser traduzido em um número de 0 a 10?